São três horas da tarde
No centro da cidade
Mais de mil pessoas
Em cada metro quadrado
Coexistem como se pudessem
Ocupar o mesmo espaço
Como se quisessem
Estar ali
Há vozes por todos os lados
Há pressa em passos largos
E aquela pontada de dor ou agonia
Que grita pelos arredores do estômago
Por não ser capaz de escolher
Entre o relógio e a asfixia
Os dias são todos iguais
Morre-se cinco para viver dois
Tudo é cinza, frio e pálido
Desde os rostos até o céu
A única gota de tinta
Mora dentro dos semáforos
Pequenos mestres que mandam nas ruas
Imodestos em cor indesejada
(Antes fôssemos mesmo daltônicos)
As semanas são todas iguais
Tudo se repete num carrossel
Não há tempo para ajudar com as sacolas
Ou com o exercício de português
Não há tempo
Há cavalos
Girando
Carregando peso nas costas
Enjoados, absolutamente tontos
E sorrindo
Sem nunca chegar
São seis horas da tarde
No centro da mesma cidade
Mais de mil pessoas
Em cada metro quadrado
Coexistem como se nunca
Tivessem sido crianças
Como se nunca
Tivessem andado descalças
Como se nunca
Tivessem sonhado
Tivessem sonhado
Ser qualquer outra coisa
Ridiculamente oposta
A tudo aquilo que se é